Quando tudo é política, o individual prejudica o coletivo (e vice-versa)
O caso da cientista Joana D’Arc Felix me entristece pacas, mas também me deixa claro a enrascada tremenda que movimentos identitários se meteram.
Exemplo para milhares de jovens negras, Felix mentiu sobre posdoc, sobre idade que entrou na universidade e aparentemente também sobre pesquisas que fez. O problema da mitomania não é apenas destruir a vida da própria pessoa, mas a de outros — ao menos dos sonhos de outros que tinham nela um exemplo.
Impossível não se perguntar “porque?”. Ela é doutora em química, superou as adversidades e conseguiu uma posição acadêmica de respeito. Porque precisava aumentar, inventar?
Um conhecido disse que era por causa da fama — que faz as pessoas quererem sempre estar no holofote e, com isso, buscam formas de conseguir o objetivo: mentindo.
Desmascarada, a primeira atitude de Felix foi usar a carta identitária. É perseguida por ser negra — e tem quem compre. Esse é o problema. De certa forma há uma obrigação para que comprem tal discurso já que basicamente é o tom dominante há tempos: Sempre que algum membro de minoria se enrasca, a turba sai em defesa usando alguma carta identirária como desculpa.
É duplamente triste, porque reproduz apenas a estupidez de que minorias são formadas exclusivamente por indivíduos maravilhosos (ou mesmo inexiste o indivíduo, mas tão somente o coletivo angelical que não é afetado caso indivíduos sejam maçãs podres), e porque mostra incapacidade de evoluir o discurso.
De certa forma o indivíduo é apagado em seus erros e exaltado em suas conquistas — também tornadas conquistas do coletivo. Cria-se uma sinuca. Coletivo e individual acabam borrados, confundidos. De um lado conquistas individuais são tidas como do coletivo, mas quando há algum problema tenta-se negar a questão porque, no fim, atinge o coletivo.
Mas a leitura, com base no benefício coletivo, é que o demérito também é coletivo, prejudicando a todos. O uso da carta identitária apenas reforça essa impressão.
O que seria um baque de qualquer forma — para o coletivo, para quem a tinha como modelo, exemplo — acaba se tornando uma derrota desse coletivo, algo muito mais profundo… e pesado.