Para derrotar Bolsonaro, o PT precisará mudar

Raphael Tsavkko Garcia
3 min readOct 9, 2018

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Se o PT quiser ter chances de derrotar Bolsonaro terá de, em primeiro lugar, colocar rédeas na sua militância.

Chamar qualquer um que não reza por sua cartilha de “fascista”, mesmo e eleitor do Bolsonaro, é implorar pra perder. Haddad, pese ter ido visitar o Lula na cadeia, recuou das declarações infelizes (criminosas?) do Dirceu e da piada da constituinte. Ele aparentemente entendeu o recado.

Mas o militante que insiste em chamar tudo e todos de fascista, em desprezar o voto de quem não apostou no Haddad (como fez a lamentável figura da Tiburi), em pressionar pelo voto no Haddad apenas porque querem, em intimidar quem está pensando em votar nulo (mas que está aberto ao diálogo e que ao menos não pensa em votar no Bolsonaro), etc irá colocar tudo a perder.

Mas claro, mesmo o recuo teria o tom da hipocrisia. O Bruno Cava Rodrigues captou bem a situação:

“Então, agora que estão em maus lençóis, que a narrativa não colou — e não colou de uma maneira espetacular — escondem os dentes e nos lançam sorrisinhos. É a maior hipocrisia: passam uma década inteira cantando de galo do lado certo da História, desdenhando, acusando e fofocando, e agora dizem querer escutar e incorporar os diferentes, querem jogar com Ciro ou Marina, até com Alckmin e Amoedo. Que cinismo mais deslambido: o partido não escuta sequer os próprios apoiadores, que dirá os outros, que dirá os desafetos.”

No entanto, é o que lhes resta. A humildade, mesmo que falsa. O PT tem que implorar por votos, não exigir o voto. O PT não tem como exigir nada, não tem esse direito, em especial porque é também responsável pelo crescimento do Bolsonaro — oras, tinha dirigente do partido defendendo que o segundo turno ideal era contra ele!

Razões para votar nulo existem.

E chamar de fascista quem opta por essa via não produz nada. Aliás, produz, o voto contra.

Quem me acompanha sabe do asco que sinto pelo PT, por sua militância, por sua direção, pelo que representa para a esquerda. No entanto assumi a posição de que um fascista é intolerável.

Não irie pedir votos ao Haddad, não irei fazer campanha, mas acredito que sim, Bolsonaro seria pior e que o voto no PT, nesse momento, é o mal menor. Mordo a língua por ter criticado essa posição antes e, hoje, assumi-la novamente, mas creio que estamos diante de uma situação em que não dá para não ter lado.

Respeito quem escolhe a neutralidade, mas considero um equívoco. O PT, por pior que seja, respeitou minimamente as regras democráticas. Sim, abusou, esgarçou e aqui e ali até passou da linha, mas não temos uma ditadura, não somos a Venezuela. Bolsonaro, no entanto, se jacta de defender a ditadura militar. Seu vice defendeu durante a eleição a possibilidade de auto-golpe e uma ditadura.

Não estamos falando de discursos de militante maluco ou de direção que quer conquistar os malucos, o PT ladrou, mas não mordeu. Não somos a Venezuela. É um fato.

Já Bolsonaro é uma incógnita que eu pessoalmente não estou disposto a pagar pra ver.

O PT precisa mudar o discurso. Precisa se afastar de Lula, se afastar da cadeia, parar de chamar todos que discordam de “fascistas”, aprender humildade, mesmo a implorar pelo voto de quem, ontem, xingavam. Sim, o PT tem que trabalhar, tem que assumir seus erros, realizar a já atrasada autocrítica. E não pode apontar dedos, exigir nada, pelo contrário, será exigido e terá de responder à altura.

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Raphael Tsavkko Garcia
Raphael Tsavkko Garcia

Written by Raphael Tsavkko Garcia

Journalist, PhD in Human Rights (University of Deusto). MA in Communication Sciences, BA in International Relations. www.tsavkko.com.br

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