Ninguém queria derrubar o PT em 2013: A caixa de pandora foi aberta pela repressão

Considero o Wilson Gomes um intelectual necessário e bastante coerente, daí minha surpresa ao vê-lo se alinhar ao mesmíssimo discurso petista de que 2013 fez nascer o fascismo, como se fosse possível traçar uma linha direta entre os maiores protestos que o país viu até então — por direitos, por tarifa zero, contra violência policial, etc — e a eleição de Bolsonaro.
Oras, eu sequer consigo ver uma linha direta entre 2013 e a fundação do MBL — grupo fundamental para o crescimento e eleição de Bolsonaro e da extrema-direita brasileira.
A galera do “2013 fez nascer o fascismo” parece que desconhece que o MPL fazia protestos todos os anos e que em 2013 houve um esmagamento das ruas pelo PT e aliados (de ocasião ou não) que levou a um esvaziamento assumido pela direita. Ninguém queria derrubar o PT em 2013, não era sobre o PT ou sobre derrubar governos, mas o PT achou que era e usou sua força pra silenciar as ruas, cooptar, etc.
Aí não gostaram do que nasceu no lugar.

Antes de se traçar a linha é preciso entender o que significou o processo de esmagamento de 2013 — que tanto se deu pela violência policial quanto por pressão ideológica e cooptação por parte do PT. Não surpreende que setores do PSOL hoje também se coloquem contra os protestos dos quais participaram. Interessa à narrativa vitimista do PT de que a queda de Dilma começou ali — e não a crise econômica que o PT jogou o país e a incapacidade de Dilma de manter sua base.
Não foram as pessoas que foram às ruas que escolheram (sozinhos) os políticos que viriam a ser eleitos. Quem foi às ruas tentou melhorar alguma coisa. Não deu. PArece que a preferência é por ninguém fazer nada.
Desmobilizemos movimentos socias porque algum dia, quem sabe, um de seus protestos pode crescer e o fascismo virá nos morder.
Eu queria ter acesso à bola de cristal do Wilson Gomes.

Porque até 2013 o MPL fazia protestos TODOS os anos — com repressão policial imensa. Todos os anos pelo país rolavam protestos contra aumento das passagens. Em 2013 virou um movimento, mas parece que o professor sabia de antemão o futuro… e não nos avisou?
Qual deveria ter sido o curso? Em dado momento o MPL deveria ter aceitado a brutalidade policial e mandado parar tudo porque depois iria surgir o MBL nos rescaldos? É muito fácil dizer isso após o fato e pregar uma linha contínua inexistente.
Apesar de se tratar de um período de análise complicada, de mil nuances, não resta dúvida de que o crescimento do fascismo é culpa dos fascistas e daqueles que em 2013 se colocaram ao lado da repressão, fazendo com que a esquerda perdesse espaço nas ruas e os movimentos recuassem.
Como não canso de repetir, não existe vácuo na política e o espao deixado pelo recuo da esquerda foi ocupado por gente de direita e francamente fascista.
Teriam surgido sem 2013? Impossível saber. Talvez sim, talvez não. Para os que vêem uma linha contínua entre 2013, impeachment da Dilma e Bolsonaro eleito a resposta seria sim, mas eu não ouso traçar uma linha tão reta e firme.
Faz parecer que o PT caiu não por sua incompetência e esforços, mas porque foi uma vítima inocente que queria o melhor para o país. E nada poderia ser mais falso. Passa por cima do próprio PT fazendo campanha para Bolsonaro na defesa do “segundo turno ideal.” Passa por cima da campanha suja do PT contra Marina. Passa por cima da cooptaçã oe desmobilização de movimentos sociais promovida pelo PT por anos a fio.
Enfim, retira toda a complexidade de anos de política para tentar culpar movimentos sociais e indivíduos que foram protestar como faziam TODO ANO e que foram brutalmente reprimidos.
É uma leitura infantil, simplista e, no fim, ressentida. Daí a surpresa de que venha de quem venha.

2013 foi gigante exatamente porque já existia uma imensa insatisfação social em meio ao mundo cor-de-rosa que o PT pintava. De país do futuro para o país onde o futuro já havia chegado. Do país com obras que deixariam marcas históricas (e deixaram, negativas) e que caminhava para ser potência.
Tudo cortina de fumaça para mascarar corrupção, incompetência e recrudescimento da repressão contra movimentos sociais e os mais vulneráveis em meio à uma crise econômica que começava a se desenhar claramente.
Por fim, se participar de um movimento que exigia MAIS democracia e a população mais próxima dos processos decisórios (goste-se ou não dessa pauta) não é um valor democrático, então o que é?
Melhor talvez seja se submeter aos coronéis e políticos em seus currais porque colocar o dedo na lama para tirar a sujeira do caminho de repente virou mergulhar de cabeça e boca aberta na lama.