A carta de Lula não apenas admite a derrota, ela busca garantir o controle sobre a militância

Raphael Tsavkko Garcia
3 min readOct 24, 2018

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A carta do Lula faz todo sentido. Ela é pra militância, não pra população. Ela é basicamente uma aceitação da derrota e uma tentativa do Lula manter o rebanho de fiéis, de mostrar que ele ainda está ali e que deve ser seguido mesmo na derrota. A lógica do Lula é impecável: Perdi, mas não vou ficar sem meus fiéis.

Diante da formação de uma frente espontânea contra o Bolsonaro, Lula se sentiu por fora. Não foi ele que armou, ele não controla, está acima dele. Marina declarou apoio ao Haddad, membros do PSDB (como o Goldman) declararam apoio ao Haddad… E o Lula não tem nada a ver com isso. Perdeu o controle. E isso ele não pode tolerar.

Vocês conseguem imaginar o que é pro Lula, preso, derrotado, ainda perder o controle do PT nas eleições? Não, ele prefere perder e ter a esperança de que ou sairá da cadeia por milagre ou de que, mesmo de lá, conseguirá ser a figura por trás (o cachorro por trás?) de quem irá nos salvar do Bolsonaro em 2022.

E a militância segue cegamente. Oras, vaiaram Cid Gomes, atacaram a Marina mesmo esta dando apoio e vaiaram o Mano Brown (com menor intensidade que as vaias contra o Cid, diga-se). Lula não pode perder esse controle e a carta significa exatamente a (re)tomada das rédeas da militância pra que essa pressão não diminua, pra que nada saia do script de Lula

O Gustavo Gindre, em outra postagem, comentou que:

“O problema é que quanto mais encurralado o PT fica, ao invés de tentar entender como se chegou aqui, mais lulista, mais devota a militância se torna.”

Concordo que mais lulista fica a militância, no entanto Lula entende muito bem o que deu errado. E sua carta é exatamente uma forma de encobrir o óbvio e manter a militância mais e mais lulista com o discurso do inimigo. Lula não pode, jamais, permitir que a militância entenda onde está o erro.

Concordo, enfim, com o Idelber Avelar, e tenho repetido há muito tempo que a única forma de vencer (ou nessa altura, de tornar a derrota menos amarga) é criticar, e criticar muito o PT, apontando que o partido é sim horroroso, sem tentar enganar o eleitor, mas deixando também claro que apesar disso Bolsonaro é pior.

“ A carta de Lula não é um “engano” ou um “erro”. É um ato explícito de sabotagem que o coloca de novo no centro do processo e manda o recado de que, para ele, mais importante do que derrotar Bolsonaro é manter o PT e o lulismo na posição hegemônica dentro do outro bloco. É um ato de irresponsabilidade total.

Aos que dizem que “não é hora de criticar”, a minha resposta é: tolos, nossa ÚNICA chance é criticar. Se o único discurso audível em defesa de Haddad for o discurso lulista, vai ser goleada. Ouçam Mano Brown. A única possibilidade de sucesso é convencer os indecisos de que a coalizão democrática não é e não será um fantoche de Lula. Essa carta de Lula torna a tarefa mais difícil, mas enfim, continuo na luta nos espaços a que tenho acesso. Faltam quatro dias.”

Repito o que já disse antes:

O PT foi péssimo e provavelmente, se eleito, seguiria sendo péssimo. Mas é um péssimo em que sempre foi permitido criticar. Nunca teve gente sendo morta na rua por não votar no PT. E Bolsonaro nem eleito foi e já tem gente morta, mais de 50 agredidas e o cara flerta com o pior autoritarismo.

Eu não tenho NADA de bom pra falar do PT exceto que o PT não é Bolsonaro. E isso já diz muito.

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Raphael Tsavkko Garcia
Raphael Tsavkko Garcia

Written by Raphael Tsavkko Garcia

Journalist, PhD in Human Rights (University of Deusto). MA in Communication Sciences, BA in International Relations. www.tsavkko.com.br

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