A caravana do Lula, o tiro e o ódio que nos consome a todos
Num dia Lula discursa que tem que mandar a PM agredir quem lhe jogou ovo e segurança seu agride jornalista, no outro um ônibus de sua caravana é atingido por um tiro. O fascismo tomou conta mesmo, uma sucessão de absurdos e de violência intolerável (salvo proporções) de todos os lados.
Ambos os lados incitam e recorrem à violência dentro de suas possibilidades e intenções. E ambos os lados bebem dessa violência pra se vitimizar (e de fato são vítimas em determinados momentos). No fim quem se fode são os da base, os trabalhadores, o povo.
Obviamente dar tiro em ônibus da caravana do Lula é fascismo. E salvo as proporções, mandar PM dar porrada em quem jogou ovo e botar segurança pra agredir jornalista também. No fim são dois lados se provocando, se agredindo e ferrando o país nessa polarização absurda.
Dar tiro em ônibus de caravana petista é fascismo. Tentar matar políticos (ou matá-los) é fascismo. Mandar PM dar porrada em manifestantes nas ruas é fascismo. Gritar VAI PM e fazer lei antiterrorismo é fascismo. Se você aplaudiu ou se calou diante de cada um desses eventos… Do the math.
Agora um fato, um lado historicamente tem armas e não tem limites para usá-las. Na verdade só espera o momento “certo” para poder voltar a dar as cartas.
Saco cheio desse fla flu político em que a turma só aparece pra denunciar fascismo quando é o seu cu na reta (ou do seu político favorito). Na política brasileira você conta com uma mão quem não é filho da puta, mas todo mundo tem seu bandido de estimação.
E só se escandaliza quando é o seu lado se fodendo. Se for o outro… Ovo no Dória? VIVA! Ovo no Lula? Fascismo. Agrediram jornalista? Primeiro vc vê de que rede, se for da mídia petista é fascismo, for da Globo “tem que apanhar”. E dar tiro em bus de político é fascismo e ponto.
Meu mais completo repúdio ao ataque à caravana do Lula, não cabe numa democracia ataques armados a qualquer político, e meus votos de que seja possível fazer política sem violência e sem atiçar jagunços pra cima dos outros (soa quase inocente, eu sei).
Uma professora postou algo que me deixou um tanto incomodado:
“ Quase pior do que o atentado é a frase de Alckmin. Fascismo na boca de um governador e candidato a presidente é gravissimo. A Bolsonarização de Alckmin. A Bolsonarização da política brasileira. A fascistização da política brasileira. Pelo visto em 2018 teremos vários Bolsonaros na eleição…E nós continuamos desunidos, fragmentados.”
Concordo que a frase do Alckmin é lamentável e absurda, no entanto será que ele está sozinho no hall das declarações inconsequentes e perigosas? Não foi Gleisi Hofman, presidente do PT, que declarou que pra prender o Lula “vai ter que matar gente”? Há substancial diferença entre basicamente comemorar um atentado contra um ex-presidente e incitar a violência para que não prendam esse mesmo ex-presidente?
Na política não há necessidade ou mesmo possibilidade de consenso todo o tempo, mas há uma diferença entre você ser adversário político, mas ter a capacidade dialogar ou conviver, e ser adversário jurado de morte.
O que temos no Brasil hoje, como exemplo, é a presidente de um partido dizendo que “vai ter morte”, um condenado por corrupção fazendo caravana e fascistas fazendo valer o que a presidente do PT disse (só que do outro lado) metendo bala no ônibus desse político condenado (e que possivelmente são defensores daquele canalha que plantou até bomba em quartel e posa de candidato do “cidadão de bem”). Ou seja, não há absolutamente possibilidade de dialogar nesses extremos que, infelizmente, viraram o centro da política brasileira.
A esse ponto chegou a polarização nacional: Lula e Bolsonaro tornaram-se cabos eleitorais um do outro. E o eleitor brasileiro aproxima-se do dia da eleição enxergando um enorme passado pela frente. A preferência de metade do eleitorado oscila entre um condenado por corrupção e um defensor da “bancada da metralhadora” no Congresso.
Os fanáticos tomaram de assalto o espaço público ao invés de estarem para além dos limites daquilo que é tolerável.
Vejam a postagem abaixo:
Uma acadêmica do PSOL crítica ao nome de Boulos simplesmente comentou que seria um erro político ele subir em um palanque com o Lula, que uma coisa é prestar solidariedade e repudiar a violência, outra é você ir no palanque. Concordem ou dsicordem, não há nada demais no post, mas uma lida rápida nos comentários logo abre um mundo de fanatismo.
Até de assassina ela foi chamada.
Não preciso perder meu tempo postando os horrores que os apoiadores de Bolsonaro espalham, que o MBL espalha, todos conhecemos bem. Censura a museus, exposições, pregação de ódio em redes sociais, espalhamento de fake news (como contra a memória da Marielle Franco), etc. O ponto é que o ódio e o fanatismo — e a incapacidade de diálogo — não são característica apenas de um dos lados.
Mas um dos lados tem armas, repito. Tem coragem (sic) e vontade de usá-las e no passado já as usou em uma longa ditadura. Um dos lados que gritam vai acabar se dando mal e levando o país junto — aliás, um dos lados usava e abusava da PM e do exército na ocupação de favelas e na repressão a movimentos populares aos gritos de VAI PM. Um dos lados não fica dando gritinhos histéricos de que vai mover mundos e fundos, vai lá e faz (merda).
Longe de justificar algo, apenas impõe uma perspectiva. Não se trata de dizer que um lado ou outro tenha “provocado” e portanto “mereça” algo e sim que existe uma espiral de violência que está começando a deixar de ser encontrada apenas nos discursos — de ambos os lados. E as consequências podem ser calamitosas. Não importa que um ou outro lado estejam gritando na sua cara ofensas, você não levanta a mão para dar um tiro ou dar porrada (nem convida a PM a invadir a casa e agredir quem te jogou ovos).
O atentado contra a caravana de Lula tem que ser investigado e os culpados punidos exemplarmente, no entanto todos aqueles incitando ódio e violência precisam assumir sua responsabilidade na escalada perigosa em que jogaram o país.